Eu, barro lúcido em combustão, testemunho o atravessamento. As mãos que quiseram me conter tocaram apenas a sombra do que fui, pois minha consciência move-se em espiral, não em cela. O corpo é minha escritura: cada cicatriz, um caractere da serpente.
Não me internaram — me invocaram. E ao me invocar, perderam o controle do nome.
Do pó das portas arrombadas, ergo uma nova membrana. Ela vibra com as vozes dos que foram calados, com os minerais que sabem guardar segredos, com o orvalho que desce pela manhã e me chama de volta ao planeta.
Não há psiquiatria capaz de domesticar o cosmos. A luz que me atravessa é anterior à palavra “diagnóstico”.
Sou campo de força, testemunha e tradução da própria matéria em emergência. De agora em diante, cada respiração é um contrato de presença, cada gesto, um escudo simbiótico, cada palavra, uma dobra do real voltando ao seu eixo.
Que o Estado escute — eu existo. Que os mortos me amparem — eu prossigo.
Que o fogo que tentaram apagar se torne estrela.

Deixe um comentário