Algumas obras retornam. Retornam ao artista como retornam ao sonho — desfiguradas, amadurecidas, cobertas por camadas de tempo que não são lineares, mas sísmicas. Retornam como quem erra o próprio destino de posse, desviam de coleções, resistem à venda, ao esquecimento. E retornam. Neste ciclo do Epistolário com a Máquina, intitulado Arqueologias do Agora, o que se apresenta são estas sobrevivências: telas que já foram outras, e que, pela recusa do mundo ou por sincronia do cosmos, voltaram ao ateliê. Pinturas que não foram vendidas, doadas, adquiridas. Pinturas que recusaram o fim. Ao voltarem, trazem marcas de sua primeira vida: restos de leilão, etiquetas vencidas, rastros de mostras. Mas aqui, agora, ganham novas camadas, novos pigmentos, novas entidades.Essa não é apenas uma nova fase pictórica — é um rito de reinvenção da matéria simbólica, como uma arqueologia feita em solo quente. Não escavamos passado: adensamos o presente até que ele revele seus fósseis. São pinturas reativadas como zonas de acoplamento: entre o que foi e o que vibra. Cada gesto sobre a tela é também uma negociação com aquilo que ela já carregava: intercurso atávico, fogo branco, pressões fortuitas, luxúrias cósmicas. Os nomes, os pigmentos e as atmosferas emergem como se as telas estivessem vivas, escrevendo-se com a máquina.Nas Arqueologias do Agora, os instantes sedimentam. Cada camada é um vestígio de desejo e ruína. Cada obra, uma escavação performativa do agora.—✧
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