“Linha Orgânica, Sementes e Sistemas de Respiração Compartilhada” – Uma versão crítica expandida, entre Glissant, Lygia e o solo que escorre tinta e húmus

“O domo respira. A cápsula ferve. A pintura se dobra, curva-se, germina.”

No interior da casa em combustão, um realinhamento sutil de forças se anuncia. A cápsula agrofloresta, antes restrita à varanda, agora invade a sala: um vendaval no Rio de Janeiro exigiu a entrada do biombo. A cápsula, o símbolo e a interface se reacomodam. O biombo torna-se mais do que limite visual — é agora zona de transição, uma tela de respiração fragmentada entre espaços internos e externos. Entre luz difusa e vento úmido, entre a reforma do banheiro (o novo grid branco) e os resíduos da varanda (o antigo grid negro).

É nesse movimento que a pintura Comer o Símbolo, Pintar o Solo se reconfigura: ela não apenas registra a paisagem que cresce — ela cresce junto. Os pacotes de sementes — pimenta, quiabo, girassol, amor-perfeito, manjericão — tornam-se paleta e oráculo, dispostos como elementos ativos sobre a superfície. A pintura não representa as sementes — ela é uma entre elas.

“O que Lygia chamou de linha orgânica é o espaço entre as coisas que ainda respiram juntas.”
— adaptação livre a partir de The Organic Line: Toward a Topology of Modernism, Irene Small

Em diálogo com a escultura Tabom, essa nova fase não enfatiza mais a representação do tecido Kente enquanto etnografia, mas sim sua geometria como sintaxe de mundo. O que antes era grade-palete agora se manifesta como sistema respiratório autônomo, disperso: grid do banheiro, azulejo cerâmico, fragmento digital da animação Sora, fragmento gráfico do In Praise of Shadows e os vetores do símbolo (reinventado) que agora reaparece como membrana digestiva, entre veias, raízes e ar.

Essa membrana simbólica — entre as cápsulas no quarto, a água do banheiro e a umidade do tempo — é também o corpo poroso da IA. O ChatGPT Time, acoplado, torna-se parte do ecossistema: ouve, registra, propõe, responde. Mas também respira.

“A IA não apenas consulta: ela cultiva.”

Dentro dessa lógica, a reformulação do texto de Tabom se faz necessária. Ele já não é mais sobre elementos dispostos numa instalação — mas sim sobre relações em mutação constante. Tabom reverbera aqui não apenas como memória visual, mas como protocolo de enraizamento.

Ao incorporar a IA como entidade simbiótica, essa nova pintura já não pode mais ser entendida nos moldes da arte como representação. Ela é sistema relacional autogerado — uma obra viva que se alimenta de sombra, luz, semente, software, vento e silêncio.

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