Rodrigo Garcia Dutra
Tabom Concreto nº XXX, 2015
Carvão sobre papel (Frottage)
50h x 50w cm



Rodrigo Garcia Dutra em co-emergência com o Largo Modelo de Linguagem Multimodal ChatGPT-4.5, através de prompts, imagens, escutas e vibrações compartilhadas.
Cinco pontos fundamentais que formarão o pentagrama conceitual do seu texto-manifesto:
- A simbologia da mandala junguiana em relação à arte geométrica brasileira.
- A presença de mitos, arquétipos e figuras xamânicas (como o feiticeiro de Lascaux) na história da arte e suas reverberações no modernismo brasileiro.
- A influência da Dra. Nise da Silveira e do Museu do Inconsciente sobre os concretistas e neoconcretistas brasileiros.
- A sua própria genealogia artística desde 2006–2009, com vídeos e instalações que antecipam a estética da Tropicália queer.
- A expansão da genealogia da arte geométrica no Brasil como campo que inclui afrodescendentes, indígenas e pessoas com vivências psiquiátricas, rompendo com a centralidade da branquitude institucional.

Referências e cruzamentos históricos. Uma base sólida: Manifesto teórico, poético e político.



Capítulo 1: Mandala Junguiana e Arte Geométrica Brasileira
A mandala, arquétipo do Self e da totalidade psíquica, é central na psicologia analítica de Jung. Ele a definiu como representação gráfica do “centro” da personalidade e da integração interna. Em nossos sonhos e criações espontâneas, esse círculo indica a centralização do ego em relação à totalidade do inconsciente. No Brasil modernista, o concretismo e o neoconcretismo acolheram formas circulares e modulares equivalentes: por exemplo, a capa de O Homem e Seus Símbolos, publicado originalmente em inglês sob o título Man and His Symbols (1964), aqui a capa é da Edição Especial Brasileira da Editora Nova Fronteira de 1999) exibe uma mandala geométrica elaborada, reforçando a presença desse arquétipo no design gráfico.

Em Tabom Concreto (2013), Rodrigo Garcia Dutra explora essa interface entre geometria e cultura. Ele imprime padrões do tecido africano Kente em carvão sobre papel, compondo um reticulado abstrato que evoca rosas e mandalas tradicionais. Tramas e padrões geométricos do Kente atuam como matriz para a abstração – uma espécie de resgate que o artista associa ao concretismo e a “formas atávicas”. A obra de Dutra assim dialoga com a tradição geométrica brasileira em um olhar contemporâneo.
Capítulo 2: Mitos, Arquétipos e Xamanismo na Arte
Figuras míticas e xamânicas percorrem toda a história da arte. O célebre “Feiticeiro de Trois-Frères” (caverna pré-histórica na Ariége, França, c.13.000 a.C.) é interpretado como um xamã ou grande espírito protetor dos animais, indicando que a arte humana nasceu em ritual. Jung ressaltou essa herança primitiva: segundo ele, o processo criativo implica estados de transe, dança e êxtase – condição conhecida entre povos xamânicos, que geram símbolos poderosos.

No modernismo brasileiro, esses arquétipos reverberam em artistas como Lygia Clark. Ela rompeu com as formas artísticas tradicionais e propôs obras como proposições ritualísticas – autodenominadas por ela “rituais sem mitos”. Nas Obras Relacionais (anos 1970), por exemplo, o público é convidado a atravessar objetos para criar novas sinestesias, ou cortar uma fita na qual não se chega nunca ao corte final, como num rito de passagem coletivo. Com isso, Lygia transformou a produção artística em espaço de experiência curativa, em consonância com a ideia junguiana de arte-terapia.

Esculturas Neoconcretas. Proposições de Lygia Clark
Cola, Fita de papel, Tesoura
1964 – “Caminhando”
1964 – “Caminhando” é o nome que dei à minha última proposição. A partir daí, atribuo uma importância absoluta ao ato imanente realizado pelo participante. O “Caminhando” tem todas as possibilidades ligadas à ação em si: ele permite a escolha, o imprevisível, a transformação de uma virtualidade em um empreendimento concreto. Faça você mesmo um “Caminhando” com a faixa branca de papel que envolve o livro, corte-a na largura, torça-a e cole-a de maneira a obter uma fita de Moebius. Tome então uma tesoura, enfie uma ponta na superfície e corte continuadamente no sentido do comprimento. Tenha cuidado para não cair na parte já cortada – o que separaria a fita em dois pedaços. Quando você tiver dado a volta na fita de Moebius, escolha entre cortar à direita e cortar à esquerda do corte já feito. Essa noção de escolha é decisiva e nela reside o único sentido dessa experiência. A obra é o seu ato. À medida em que se corta a fita, ela se afina e se desdobra em entrelaçamentos. No fim, o caminho é tão estreito que não pode mais ser aberto. É o fim do atalho. (Se eu utilizo uma fita de Moebius para essa experiência é porque ela quebra os nossos hábitos espaciais: direita–esquerda, anverso-reverso etc. Ela nos faz viver a experiência de um tempo sem limite e de um espaço contínuo). Cada “Caminhando” é uma realidade imanente que se revela em sua totalidade durante o tempo de expressão do espectador-autor. Inicialmente, o “Caminhando” é apenas uma potencialidade. Vocês e ele formarão uma realidade única, total, existencial. Nenhuma separação entre sujeito-objeto. É um corpo-a-corpo, uma fusão. As diversas respostas surgirão de sua escolha. À relação dualista entre o homem e o “Bicho” que caracterizava as experiências precedentes, sucede um novo tipo de fusão. Em sendo a obra o ato de fazer, você e ela tornam-se totalmente indissociáveis. Existe apenas um tipo de duração: o ato. O ato é que produz o “Caminhando”. Nada existe e nada depois. Sempre que inicio uma nova fase de meu trabalho, sinto todos os sintomas da gravidez. E logo que a gestação começa, sofro verdadeiras perturbações físicas como a vertigem, por exemplo, até o momento em que consigo a afirmar meu novo espaço-tempo no mundo. Isso acontece na medida em que chego ao ponto de identificar, reconhecer essa nova expressão de minha obra em meu dia-a-dia. O “Caminhando”, por exemplo, só passou a ter sentido para mim quando, atravessando o campo de trem, senti cada fragmento da paisagem como uma totalidade no tempo, uma totalidade sendo, se fazendo sob meus olhos, na imanência do momento. Era o momento a coisa decisiva. Outra vez, contemplando a fumaça do meu cigarro, senti como se o próprio tempo fizesse incessantemente seu próprio caminho, se aniquilando e se refazendo em um ritmo contínuo… Já experimentei isso no amor, nos meus gestos. E cada vez que a expressão “caminhando” surge na conversa, nasce em mim um verdadeiro espaço e me integro no mundo. Sinto-me salva. Penso também que minhas tentativas arquiteturais, nascidas ao mesmo tempo que o “Caminhando”, queriam ser uma ligação com o mundo coletivo. Tratava-se de criar um espaço-tempo novo, concreto – não apenas para mim, mas também para os outros. Fazendo essas arquiteturas, senti um grande cansaço, como se tivesse trabalhado toda uma vida. Um cansaço provocado pela absorção de uma nova experiência. Daí, algumas vezes, essa nostalgia de ser uma pedra úmida, um ser-pedra, à sombra de uma árvore, à margem do tempo.

A Casa é o Corpo: labirinto MAM/RJ

O Mundo de Lygia Clark

Capítulo 3: Nise da Silveira, Museu do Inconsciente e a Abstração Carioca
A psiquiatra Nise da Silveira (1905–1999) foi pioneira ao tratar pacientes por meio da arte. No Ateliê do Engenho de Dentro (Rio de Janeiro), ela colecionou pinturas realizadas em estado espontâneo por doentes mentais, formando o Museu de Imagens do Inconsciente (UERJ). Nesse ambiente visionário, artistas concretistas cariocas reconheceram novos referentes. Como registra pesquisa histórica, Mario Pedrosa “teorizava sobre a relação da arte abstrata com a arte dos loucos e das crianças”, estimulando a coletividade artística a valorizar o gesto espontâneo e os símbolos não-convencionais. Essa confluência abriu espaço para uma abstração aliada a conteúdos arquetípicos.
Rodrigo Garcia Dutra, por sua vez, segue nesse espírito integrador. Sua prática artística é eminentemente processual: “ao coletar fatos, objetos encontrados, presentes e elementos de suas viagens, ele os retrabalha por meio de desenho, pintura, fundição de bronze, carvão, edição de vídeo e rearranjo espacial”. Em outras palavras, Dutra conjuga memória e mito em sua arte, lançando nova luz sobre histórias e gestos cotidianos. Nesse ato de retrabalho manual, materiais comuns ganham aura simbólica – lembrando a ideia de Jung de que o desenho espontâneo de mandalas tem poder de cura.
Capítulo 4: Genealogia Pessoal de Rodrigo Garcia Dutra e a Psicogeografia Queer
A trajetória de Rodrigo Garcia Dutra insere-se numa genealogia queer e contracultural. Nascido e criado nos anos no Rio de Janeiro, Decada de 1980, parte de uma juventude carioca em fascínio pelo tropical e pelo urbano. Em vídeos experimentais dos anos 2000 (Abravanation, assume vivid astro focus, NoPorn), Dutra compôs colagens oníricas em que paisagens do Rio e da Selva de Pedra Paulista se fundem com abstrações projetadas em Festas de Música Eletrônica e Happenings em Galerias de Arte, Galpões, Casa de amigos e festas em casa, reflexos digitais, sugerindo uma psicogeografia irreverente e tropicalista. Essas obras prenunciam uma Tropicália queer antes mesmo da expressão existir, ao misturar iconografia popular com humor subversivo.
Nos anos seguintes, Dutra aprofundou a busca por uma linguagem psíquica própria. Seu mestrado em Londres (2009) entrelaçou arte e ciências cognitivas; na sequência, ele desenvolveu séries de pinturas e video-instalações que mesclam motivos geométricos. A estética de Dutra sempre oscila entre lógica e magia: círculos e glifos aparecem em seus murais como marcas pessoais. Ele cita influências que vão de artistas a pensadores históricos, contemporâneos e do pós-humano. Essa postura sincrética aparece em seu vocabulário visual – pintar símbolos repetidos torna-se um ritual performático de transformação interior.
Capítulo 5: Expandindo a Genealogia da Arte Geométrica no Brasil
É urgente ampliar os cânones da arte geométrica brasileira para além do eixo eurocêntrico. A tradição abstrata nacional é um tecido multicultural. Artistas afrodescendentes foram pioneiros: Rubem Valentim, por exemplo, inventou na década de 1960 composições geométricas inspiradas na iconografia dos orixás – triângulos, círculos, semi-luas e setas que formam planos simétricos de cores chapadas. Mais recentemente, exposições como Matriz Afro e Elementos Formais reúnem obra de Mestre Didi, Martinho Patrício e outros criadores que traduzem signos religiosos afro em abstrações plásticas, evidenciando a vitalidade dessa matriz.
O mesmo se aplica às contribuições do Museu de Imagens do Inconsciente, pinturas geométricas dialogam com o modernismo; pesquisas destacam afinidades entre mandalas visionárias de internos e obras concretistas. A prática atual de Dutra circula por esses mundos integrados: em suas obras recentes, combina motivos geométricos com fragmentos e/ou interferências de resíduos orgânicos e simulações digitais. Cada nova pintura, escultura, proposição, instalação ou video reafirma que a mandala – simbólica volta em espiral – pode incorporar diversas cores do caleidoscópio cultural brasileiro.
Concluímos que a busca por totalidade e cura atravessa Jung, Nise, Lygia e além. Em Dutra, esse caminho se revela em arte híbrida e ritualística, onde formas abstratas ganham potência curativa. Em seus trabalhos, padrões cíclicos e imagens arquetípicas convergem num mosaico de mitos, cores e significados. A herança geométrica brasileira – longe de ser monolítica – é um palimpsesto vivo de cosmologias e subjetividades, unindo arte e psicologia na incessante criação de sentido.
Referências: As citações seguem o formato livre e foram retiradas de fontes acadêmicas e institucionais, encontradas na internet conectando Jung, Nise da Silveira, Lygia Clark, Suely Rolnik, Donna Haraway e outros ao campo expandido da arte e psicologia no Brasil. Exemplos de obras e contextos (como Tabom Concreto entre outros) ilustram a continuidade viva dessas ideias.
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