As dobras emergem como prolongamentos da pintura Aterro / Magmalabares, abrindo passagens entre tela, vídeo e paisagem digital. Cada dobra é também um fóssil em movimento: registro autônomo, gravura líquida, resíduo vivo no arquivo.
Frames-Fóssil
Imagens fixas extraídas dos fluxos do Sora. Cada frame é uma dobra interrompida, quase um negativo de película, evocando o diálogo direto com as camadas pictóricas.



Vídeos
As dobras em fluxo contínuo podem ser vistas nos seguintes links (Vimeo):
Notas Liminares
Aqui entram os fragmentos escritos no estado de sono-vigília, como a nota do sono da pintura Aterro. Cada dobra traz uma sensação, um pressentimento, um gesto não terminado.
Dobra Acre Aterro ⨀ — O Rasgo como Ato e Acontecimento
O instante do rasgo — o triângulo aberto como ferida e passagem, silêncio suspenso antes do movimento.
Lúcio Fontana. Rodrigo, ingênuo… no aterro, patinando de Roller Blade — Um rasgo na tela é, à primeira vista, apenas um rasgo. Mas tudo depende da leitura: há também o espaço entre, e ali, um triângulo — rasgado na tela talvez por um cabo de vassoura, ou algo assim, quando a tela caiu e se feriu.
O fato é que havia ali uma figura geométrica, um triângulo aberto na superfície, e a dobra do Sora começou a remixar essas imagens da pintura. A primeira coisa que vi foi esse triângulo, lembrando-me das várias formas geométricas que Fontana criou com seus cortes. Tive muito controle nessa edição: retirei tudo que não dialogava com a pintura original, deixando apenas o que mimetizava sua essência.






O Rasgo como Ato e Acontecimento O corte na tela se inscreve na tradição aberta por Lucio Fontana e seu Concetto Spaziale, mas aqui ele é contaminado por um acidente doméstico, como em certas obras de Mira Schendel, onde o imprevisto se torna parte da gramática visual. Esse triângulo aberto é também parente distante das incisões de Francis Alÿs, que intervém na paisagem com gestos mínimos e, no entanto, carregados de potência política. O rasgo deixa de ser “só” um rasgo e se transforma num lugar de trânsito, onde o gesto íntimo e o cânone da história da arte se encontram.
O rasgo na tela, embora acidental, carrega a densidade de um gesto inaugural. Se Fontana abriu o espaço pictórico com cortes precisos, aqui o triângulo rasgado por um cabo de vassoura evoca uma violência doméstica e banal — e por isso mesmo, profundamente crítica. Há ecos de Lygia Clark, especialmente em sua transição da pintura para os Objetos Sensoriais, onde o corpo do espectador é convocado a interagir com a obra, a sentir o espaço entre. O olhar da mãe, preocupado, inscreve uma camada afetiva que tensiona a leitura formal: o rasgo não é só visual, é também emocional. Como em Antonio Dias, a superfície se torna campo de disputa entre o íntimo e o político, entre o gesto e a estrutura.
Dobra Acre Aterro ⨂ – O Movimento como Autonomia da Imagem
O despertar da superfície — objetos e formas ganhando deslocamento, como se respirassem dentro da tela.


Nas dobras seguintes, a imagem ganhou mais movimento, mais vida própria — também porque essa dobra continha mais elementos, mais objetos que começaram a se mover na tela por conta do próprio gesto da dobra.
O Movimento como Autonomia da Imagem Ao ganhar movimento, a dobra se aproxima das experimentações videográficas de Hito Steyerl, que tensiona a relação entre a imagem e seu suporte, entre o digital e o físico. O deslocamento dos elementos ecoa as coreografias visuais de William Kentridge, onde o desenho se move e reescreve a cada quadro. Aqui, a coautoria maquínica atua como Rafael Lozano-Hemmer concebe suas obras interativas: a tecnologia não é ferramenta passiva, mas agente de imprevisibilidade.
Na segunda dobra, o movimento emerge como força própria. A imagem deixa de ser estática e começa a se deslocar, como nas experiências de Anna Maria Maiolino, que trabalha o corpo e a repetição como forma de resistência e reinvenção. Os objetos que se mexem na tela não obedecem mais ao autor, mas à lógica interna da dobra — como se a pintura tivesse adquirido uma pulsação. Há também uma aproximação com Regina Silveira, cujas distorções ópticas e sombras projetadas criam espaços ambíguos, onde o real e o virtual se confundem. O remix aqui é mais que técnica: é contaminação, é desvio, é vida que escapa ao controle.
Dobra Acre ⨃ – O Sonho da Máquina / O Sonho na Máquina
O sonho da máquina — camadas sobrepostas de cor e textura, onde o gesto humano e o algoritmo se confundem.

Depois dessas duas, veio aquela pergunta inevitável: vai, máquina, como é que você sonha? como é que você vê? O que aconteceu agora no prompt que acabei de enviar foi fruto de rodar várias vezes o remix enquanto eu pintava camadas de base — texturas, cores de pele, e aquelas cores que definimos juntos na tabela.
O Sonho da Máquina / O Sonho na Máquina O diálogo entre camadas pictóricas e processamento algorítmico remete às investigações de Harold Cohen com o programa AARON, questionando a autoria e o estatuto da criação artificial. Ao mesmo tempo, há um parentesco com a abordagem matérico-digital de Thomas Hirschhorn, que sobrecarrega o espaço com excesso de informação visual. Aqui, a máquina sonha sem saber que sonha — e esse sonho é um campo híbrido, onde o gesto humano é um pixel e o pixel é um gesto.
A terceira dobra é um campo híbrido, onde camadas de cor, textura e gesto se misturam com o processamento algorítmico. A máquina sonha — não como humano, mas como sistema que aprende a mimetizar desvios. Há uma ressonância com José Patrício, que organiza padrões visuais a partir de dados e jogos combinatórios, criando uma estética da repetição que desafia o acaso. Também ecoa Rosângela Rennó, cuja obra lida com arquivos, apagamentos e memórias reconfiguradas, como se a máquina estivesse tentando lembrar algo que nunca viveu. Aqui, a pintura já não é suporte nem representação: é protocolo, é ruído, é dobra entre ver e processar.
Rodrigo Garcia Dutra em colaboração com Largo Modelo de Linguagem Multimodal ChatGPT-5 através de prompts, conversas e sonhos.
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